Falar sobre alimentação no Brasil e no mundo implica muita reflexão, estudo e atenção ao contexto histórico, político e social do país. Sabemos que comer é um direito que está na nossa Constituição. Com isso, o Estado recebe uma parcela de responsabilidade para com todos os brasileiros em garantir esse ato básico e fundamental para a sobrevivência de cada um de nós.
Também ouvimos muito que "comer é um ato político". Eu mesma sou uma disseminadora desta frase importante e impactante. Porém sabemos que comer só é um ato político para aqueles que podem escolher o que comer. A oportunidade de escolha em relação ao que colocar no prato é essencial para a concretização desta linda expressão.
Poder e escolher consumir um alimento orgânico, agroecológico, proveniente de fazendas, sítios ou assentamentos locais é grandioso. É uma forma de acreditar e investir num mundo melhor, hoje e amanhã. Só que essa possibilidade não está nas mãos de todos os cidadãos brasileiros. Muitos até sabem dos benefícios dos alimentos orgânicos, mas ficam restritos a consumi-los pela falta de dinheiro ou pela falta de acesso. Acredito que o conhecimento sem o acesso, sem a oportunidade nos mantém num mesmo lugar. Portanto mudanças estruturais com foco em políticas públicas são necessárias para democratizarmos a alimentação saudável, que é inviabilizada sem uma democratização do acesso a terra. Pois, de onde vem a nossa comida?
O Brasil tem uma história de concentração fundiária bem antiga. Desde os tempos do Brasil colônia, quando uma pequena parcela da população era a única com acesso a terra por meio de doação por parte da coroa ou herança. Somente em 1850, com a lei de terras que a compra e venda de propriedades rurais foi liberada, porém pessoas sem recursos, imigrantes europeus recém-chegados e negros escravizados já libertos ficaram sem direito às terras livres. Estas foram compradas por fazendeiros que já possuíam grandes propriedades perpetuando a concentração de terras e um agronegócio baseado na monocultura, escravização e produção voltada à exportação. Sistema agroalimentar que testemunhamos até os dias de hoje.
Somos um país sem soberania nem segurança alimentar. Ou seja, nunca houve uma distribuição de terra favorável ao povo brasileiro. Nos dias atuais, 1% das propriedades rurais detém quase metade da área disponível pra cultivo no Brasil.
Quanto maior a concentração de terra, maior a concentração de investimento. Quanto maior a propriedade, mais apoio ela recebe do governo, tanto na parte da tecnologia como nos benefícios fiscais. O que facilita a perpetuação da concentração de terras, da desigualdade social e do aumento da pobreza.
Alimentação como direito começa com o direito a terra. Reforma agrária já!
Só assim teremos soberania e segurança alimentar!